sábado, 26 de dezembro de 2015

Diamonds Ovnis e Paraísos



No dia 13 de Junho na Antiga Sede da Confraria dos Alquimistas (R; Jorge Kenworthy, 111 - Vila Hortência) iniciamos nossos encontros na Oficina de Teatro Ritualístico para investigarmos o universo das obras "Martin Cererê" de Cassiano Ricardo e "Como a Lua" de Vladimir Capella para montagem Teatral da Cia Fragmentos Teatrais.

Cor e Imagem o Mito do Brasil-Menino de Cassiano Ricardo

Aparecido, pela primeira vez, em 1928, Martim Cererê tem uma história que os editores julgaram interessante contar aos que ainda não a conhecem. No auge da campanha renovadora, iniciada pela SEMANA DE ARTE MODERNA. 

Acusado de praticar uma poesia muito "visual", exterior, Cassiano Ricardo responde que não podia haver finura numa poesia intencionalmente tosca, pode se mesmo dizer rupestre; em que contam os elementos fisicais, como a palavra coisa, as imagens "coisificadas", as soluções acústicas, o visualismo intenso, a restauração do som, da cor e do tato.

João Ribeiro o aplaude calorosamente, dizendo que o livro continha "páginas fulgurantes". "Brasileiro até à medula; quase aborígine." Carlos Drummond de Andrade o considerou, mais tarde, "uma peça clássica da nossa poesia moderna", e Guilherme de Almeida o classificou como "o livro da Gênese Verde do nosso verdadeiro Antigo Testamento."



O Jogo do Tempo e do Espaço: Como a Lua


“Pode se mostrar tristeza às crianças? Falar de rejeição? De abandono? De morte? De dor?” (Vladimir Capella)

(1981) é o primeiro texto de Capella que trata do desejo e da paixão. É também a primeira peça com uma história criada por ele. Com ela nasce a primeira personagem capelliana: Payá, um índio que nasce predestinado a sofrer pelo amor de Colom. Desesperado por ter sido abandonado pela amada, morre de tristeza, despertando a compaixão do deus Rudá, que lhe permite dormir por cem anos. Passado esse tempo, Payá ressurge, em meio à civilização, na figura de um palhaço.

Os recursos encontrados por Vladimir para falar à criança sobre a dor provocada por um amor não correspondido, abriram novos caminhos para sua então nascente dramaturgia.

A solução encontrada foi a de mostrar o drama de Payá em um plano mítico, ocorrido em um tempo distante – o princípio do mundo – e entremeá-lo com cenas urbanas, protagonizadas por crianças contemporâneas. Estas, com suas dúvidas e inquietações em relação ao amor, ao nascimento e à morte, traçam um paralelo entre ambos os tempos da ficção, estabelecendo uma dialética entre os conflitos de Payá e os seus próprios.

O crítico Rui Fontana Lopez observa com bastante clareza a relação entre os dois planos:

“O conflito tem solução na ‘morte’ do protagonista para renascer após um sono de cem anos, num mundo que, embora diferente do anterior, contém os mesmo elementos. Os jogos, brincadeiras e vivências de um grupo de crianças localizadas no ‘aqui e agora’ fazem o contraponto lúdico e atualizam o motivo mítico que se desenrola na floresta.” (10)
Para distanciar a história de Payá no tempo e no espaço, o texto introduz um narrador, através de voz gravada em off.

A presença do narrador (tal como a do conflito) era um dos elementos que compunham um certo conjunto de critérios então utilizados para avaliar a qualidade de um texto de teatro para crianças. Tais critérios foram substancialmente redimensionados pela dramaturgia contemporânea. Entretanto, para os padrões da época, o conflito era indispensável e a inserção de um narrador indicava um mau texto, pois muitas vezes substituía a ação das personagens ou manifestava as pretensões didáticas do autor.

Sobre a questão, o autor afirma:

“A gente costuma achar que o narrador aparece sempre quando o dramaturgo não sabe como resolver uma cena. E, de certa forma, isso é verdade. É uma teoria. Mas nada é absoluto. Tanto que no ‘Como a Lua’ havia um narrador sim, em off, gravado pelo Meceni, que começava o espetáculo. E começava tipo ‘era uma vez..’, exatamente como quem começa a contar uma história. Pronto. Era isso o que eu queria. Mesmo que isso contrariasse a teoria. Naquele momento, para aquela peça, era aquilo.” (V.C.)

A opção de Vladimir por introduzir um narrador em Como a Lua, mais do que uma ousadia, traduzia uma necessidade intrinsecamente ligada à natureza da história que iria contar – talvez o mais triste drama amoroso que o teatro infantil já conhecera.

Intencionalmente ou não, o autor traça um claro limite entre ficção e realidade, permitindo que crianças muito pequenas acompanhem a história com a dose certa de emoção e de distanciamento.

Além do narrador em off, um coro de atores comenta os acontecimentos com canções tocadas e cantadas ao vivo, ou mesmo interfere em algumas cenas:

“Os atores – no fundo ou dos lados do palco – sentados em cadeiras, esperam sua vez de atuar. (Os papéis todos podem ser dobrados, com exceção de Payá).” 

Em Como a Lua, Vladimir conserva alguns dos elementos utilizados nas peças anteriores e os transforma: a música é cantada e tocada ao vivo, mas em muitos momentos rubricas indicam que ela seja gravada com uma sofisticada orquestração. O “Deus Rudá”, segundo o texto, deve ser personificado por um grande pano, quase como uma síntese linguagem visual de Panos e Lendas. O coro de atores/contadores de histórias dos espetáculos anteriores é mantido, mas o comportamento feérico e espontâneo que os caracterizava é aqui modificado: o grupo, como o exposto pela rubrica acima citada, permanece sentado em cadeiras distribuídas pelo palco para executar as canções da peça, ou simplesmente assistir em silêncio ao desenrolar dos acontecimentos.

O binômio linguagem coloquial x linguagem formal já utilizado em Panos e Lendas é aqui ampliado: todas as falas das cenas referentes à história de Payá são construídas na segunda pessoa, enquanto que as demais, incluindo as do narrador, estão na terceira, diferenciando passado e presente, ficção e “realidade”.

Em termos da divisão do texto em cenas, Como a Lua também se diferencia das peças anteriores. Até então, o autor atribuía um título a cada cena. Desta vez, Capella apenas as numera e introduz um prólogo e um epílogo, cujas funções são bastante precisas: o prólogo apresenta o deus do amor, Rudá, fazendo surgir de suas entranhas Payá e Colom e determinando seus destinos. O epílogo mostra Payá ressurgindo entre as crianças, cem anos depois de “morrer”.

Finalmente, a poesia já contida nas letras das músicas de Panos e Lendas e de Avoar, aqui passa a integrar as falas das personagens. O narrador, por exemplo, assim se refere a Payá:

“…seu coração e seus pensamentos seriam capazes de clarear um pedaço do céu – se uma estrela cadente o permitisse – de tanta limpidez e pureza que tinham.” 

O espetáculo novamente surpreende a crítica especializada, que reitera (a exemplo do ocorrido com Avoar) sua adequação a qualquer público, independentemente de faixa etária:

“Vladimir Capella conseguiu dar o seu recado com este espetáculo lindo, esse belo musical, tão brasileiro na sua forma e tão universal no seu conteúdo, bom para todas as idades, programa obrigatório para o nosso público infanto-juvenil – ou qualquer outro.” 

Resta dizer que o papel redentor da arte presente em Avoar reaparece em Como a Lua, pois Payá restaura o equilíbrio perdido e supera seu traumático passado amoroso tornando-se o artista mais amado pelas crianças – o palhaço.


A Pesquisa


Nossa Oficina se apoiou no estudo e reconhecimento da estrutura óssea e em exercícios de respiração e ressonância da voz. Além disso praticamos exercícios da escola de pensamento oriental, muitos deles retirados das Artes Marciais e outros sugeridos pelo ator Yoshi Oida em seus dois respectivos livros "O ator errante" e "O ator invisível". O grupo leu escritos de pensadores como; Antonin Artaud, Gerzy Grotowisky e Valere Novarina que ofereceram reflexões sobre a cena e o ato Teatral.


"Diamonds Ovnis e Paraísos"


Miscigenação dos tempos das palavras e das eras. Nosso texto salta nas camadas do tempo para revelar nossas origens e a história dos encontros das raças. Além disso, o amor, esse mendigo errante, serve de fio condutor para atravessar terras ainda não nominadas, serve de berço para o nascimento desse Menino-Brasil, e de esperança para a continuação da vida através da figura do primeiro palhaço dessas terras Tupiniquins, o Índio.


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