Jefferson Gonçalves que construiu essa experiência em conjunto à Confraria dos Alquimistas
e as pesquisas artísticas musicais.
Jorge Kasoia Com sua arte em Grafite e Exposição de Quadros.
Fotógrafo Bruno Campanini
APOIO 100% Às Terças-Santas da Confraria dos Alquimistas e Espetáculos!
Projeto Sarjeta
Estreando o Programa MESOM Junto à Confraria dos Alquimistas
HERMANOS QUE TOCARAM NA CONFRARIA OU DEIXARAM SUAS ARTES NA NOSSA HISTÓRIA NO ANO DE (2014)
Dani Nega, Ricardo Henrique, Ícaro Rodrigues, Mascarados e Nus, UclãDuVersu, Alerta Rap, Banda Lual Nativa, Banda Conjecturas, Leo de Abreu, Ananda Jacques, Jorge Kasoia, Projeto Sarjeta, Roger Torquato e Convidados, Clara Nolasco e convidados, Inato Sonoro, Zambatema, Marimbondos, Bass DÉffect, Banda Footprints, Banda Rivotril, Gabriel Gaier, Coletivo Berro D'Água, Carne de Segunda, Quintal Livre, Quarta da Rima, Coletivo Cê, Zezé (Escultor), Gregos e Baianos, Raízes, Família Matula de Teatro, Cia Fragmentos Teatrais, Txai Ateliê Cultural e outros coletivos artísticos que apoiaram a Confraria dos Alquimistas de formas criativas e colaborativas.
HERMANOS
El adjetivo germanus (nada que ver con o gentilicio Germanus) significava em latin natural, genuino, auténtico, que viene del latín germen. (forma disimilada de genmen), germen, brote, retoño, voz relacionada con genus, género y con gignere, engendrar, palabras todas de una extensa família indo-europea.
PARA CONECTARMO-NUS
A casa de ecossistema bio-cultural Confraria dos Alquimistas é um espaço que agrega e reúne coletivos artísticos. Nosso intuito é fornecer espaços para trocas de materiais e pesquisas, criando uma rede de Hermanos que se auxiliem na produção e na circulação de manifestações culturais: Teatro, Musica, Dança, Artes Plásticas, Literatura, Cinema, Artes Marciais, Yoga e Permacultura, Workshops e Vivências.
A ideia é manter esse ecossistema bio-cultural fluindo naturalmente, através das trocas que acontecem durante os encontros entre artistas que frequentam nosso espaço. Para isso criamos a TERÇA FEIRA SANTA. Uma manifestação que ocorre toda terça feira a fim de reunir os artistas da cidade e da região aos amantes da arte, criando uma relação de intimidade com o público que nos prestigia, além de fortalecer nosso sentido de irmandade, pois desses encontros nascem coletivos, projetos e parcerias. UM ESPAÇO onde podemos nos expressar artisticamente e re-aprender a olhar a arte do outro e consequentemente a arte que produzimos. Um espaço para trocar ideias, pontos de vista sobre a vida e a arte, refletirmos sobre nosso espaço no mundo, e contribuirmos juntos para o refinamento de nosso fazer artístico. Se você frequenta nosso espaço e contribui para o seu funcionamento, considere-se um HERMANO. Mais do que Latino Americanos, nosso laço é terrestre, de doação à terra, e consequentemente aos seus filhos. Nossa união e arte transmuta paradigmas e derruba pré-conceitos.
Bem vindos ao espaço de decolagens conscienciais e aterrizagens artísticas...
ALQUIMISTAS AQUI SE ENCONTRAM. VENHA FAZER PARTE DESSA ÉGREGORA.
AQUI SE TRANSMUTA NO ENCONTRO.
"A terra, o trigo, o pão, a mesa, a família (a terra); existe neste ciclo, dizia o pai nos seus sermões, amor, trabalho, tempo.
Lavoura Arcaica - Raduan Nassar - Cap 28
Abaixo texto que ilustra a situação da América Latina. "As veias abertas da América Latina" livro do escritor Eduardo Galeano, obra que vale muito a pena conhecer, no final do texto uma sugestão de livros que certamente vão gerar grandes reflexões. Boa leitura.
CENTO E VINTE
MILHÕES DE CRIANÇAS NO CENTRO DA TORMENTA
Há dois
lados na divisão internacional do trabalho: um em que alguns países
especializam-se em ganhar, e outro em que se especializaram em perder. Nossa
comarca do mundo, que hoje chamamos de América Latina, foi precoce:
especializou-se em perder desde os remotos tempos em que os europeus do
Renascimento se abalançaram pelo mar e fincaram os dentes em sua garganta.
Passaram os séculos, e a América Latina aperfeiçou suas funções. Este já não é
o reino das maravilhas, onde a realidade derrotava a fábula e a imaginação era
humilhada pelos troféus das conquistas, as jazidas de ouro e as montanhas de
prata. Mas a região continua trabalhando como um serviçal. Continua existindo a
serviço de necessidades alheias, como fonte e reserva de petróleo e ferro,
cobre e carne, frutas e café, matérias-primas e alimentos, destinados aos
países ricos que ganham,
consumindo-os, muito mais do que a América Latina e ganha produzindo-os. São muito mais altos os
impostos que cobram os compradores do que os preços que recebem os vendedores;
e no final das contas, como declarou em julho de 1968 Covey T. Oliver,
coordenador da Aliança para o Progresso, "falar de preços justos, atualmente, é um conceito medieval. Estamos
em plena época da livre comercialização..." Quanto mais liberdade se
outorga :" aos negócios, mais cárceres se torna necessário
construir para aqueles que sofrem com os negócios. Nossos sistemas de
inquisidores e carrascos não só funcionam para o mercado externo dominante;
proporcionam também caudalosos mananciais de lucros que fluem dos empréstimos e
inversões estrangeiras nos mercados internos dominados. "Ouve-se falar de
concessões feitas pela América Latina ao capital estrangeiro, mas não de
concessões feitas pelos Estados Unidos ao capital de outros países... É que nós
não fazemos concessões", advertia,
lá por 1913, o presidente norte-americano Woodrow Wilson. Ele estava
certo: "Um país - dizia - é possuído e dominado pelo capital que nele se
tenha investido." E tinha razão: Na caminhada, até perdemos o direito de
chamarmo-nos americanos, ainda que os haitianos e os cubanos já aparecessem
na História como povos novos, um século antes de os peregrinos do Mayflower se
estabelecerem nas costas de Plymouth. Agora, a América é, para o mundo, nada
mais do que os Estados Unidos: nós habitamos, no máximo, numa sub- América,
numa América de segunda classe, de nebulosa identificação.
É a América
Latina, a região das veias abertas. Desde o descobrimento até nossos dias, tudo
se transformou em capital europeu ou, mais tarde, norte-americano, e como tal
tem-se acumulado e se acumula até hoje nos distantes centros de poder. Tudo: a
terra, seus frutos e suas profundezas, ricas em minerais, os homens e sua
capacidade de trabalho e de consumo, os recursos naturais e os recursos
humanos. O modo de produção e a estrutura de classes de cada lugar têm sido
sucessivamente determinados, de fora,
por sua incorporação à engrenagem universal do capitalismo. A cada um dá-se uma
função, sempre em beneficio do desenvolvimento da metrópole estrangeira do
momento, e a cadeia das dependências sucessivas torna-se infinita, tendo muito
mais de dois elos, e por certo também incluindo, dentro da América Latina, a
opressão dos países pequenos por seus vizinhos maiores e, dentro das fronteiras
de cada país, a exploração que as grandes cidades e os portos exercem sobre
suas fontes internas de víveres e mão-de-obra. (Há quatro séculos, já existiam
dezesseis das vinte cidades latino-americanas mais populosas da atualidade.)
A brecha se
amplia. Em meados do século passado, o nível de vida dos países ricos do mundo
excedia em 5O% o nível dos países pobres. O desenvolvimento desenvolve a
desigualdade: Richard Nixon anunciou, em abril de 1969, em seu discurso perante
a OEA, que no fim do século XX a renda per capita nos Estados Unidos será
quinze vezes mais alta do que esta mesma renda na América Latina. A força do
conjunto do sistema imperialista descansa na necessária desigualdade das partes
que o formam, e esta desigualdade assume magnitudes cada vez mais dramáticas.
Os países opressores tornam se cada vez mais ricos em termos absolutos, porém
muito mais em termos relativos, pelo dinamismo da disparidade crescente. O
capitalismo central pode dar-se ao luxo de criar e acreditar em seus próprios
mitos de opulência, mas os mitos não são comíveis, e os países pobres que
constituem o vasto capitalismo periférico o sabem muito bem. A renda média de
um cidadão norte-americano é sete vezes
maior que a de um latino-americano, e aumenta num ritmo dez vezes mais
intenso. E as médias enganam, pelos insondáveis abismos que se abrem, ao sul do
rio Bravo, entre os muitos pobres e os poucos ricos da região. No topo, com
efeito, seis milhões de latinoamericanos açambarcam, segundo as Nações Unidas;
a mesma renda que 14O milhões de pessoas situadas na base de pirâmide social.
Há 6O milhões de camponeses, cuja fortuna ascende a 25 centavos de dólares por
dia; no outro extremo, os proxenetas da desgraça dão-se ao luxo de acumular
cinco milhões de dólares em suas contas privadas na Suíça ou nos Estados
Unidos, e malbaratam na ostentação e luxo estéril - ofensa e desafio - e em
inversões improdutivas, que constituem nada menos do que a metade da inversão
total, os capitais que América Latina poderia destinar à reposição, ampliação e
criação de fontes de produção e de trabalho. Incorporadas desde sempre à
constelação do poder imperialista, nossas
classes dominantes não têm o menor interesse em averiguar se o patriotismo
poderia ser mais rentável do que a traição ou se a mendicância é a única forma
possível de política internacional. Hipotecase a soberania porque "não há
outro caminho"; os álibis da oligarquia confundem interessadamente a
impotência de uma classe social com o presumível vazio de destino de cada
nação.
Josué de
Castro declara: "Eu; que recebi um prêmio internacional da- paz, penso
que, infelizmente, não há outra solução que a violência para América
Latina." Cento e vinte milhões de crianças se agitam no centro desta
tormenta. A população da América Latina cresce como nenhuma outra; em meio
século triplicou com sobras. Em cada minuto morre uma criança de doença ou de
fome, mas no ano 2OOO haverá 65O milhões de latino-americanos, e a metade terá
menos de 15 anos de idade: uma bomba de tempo. Entre os 28O milhões de
latino-americanos há, aualmente, cinqüenta milhões de desempregados ou
subempregados cerca de cem milhões de analfabetos; a. metade dos latino-americanos vive
apinhada em moradias insalubres. Os três maiores mercados da América Latina -
Argentina, Brasil e México - não chegam a igualar, somados, a capacidade de
consumo da França ou da Alemanha Ocidental, mesmo que a população reunida de
nossos três grandes exceda de muito a de qualquer país europeu. A América
Latina produz, hoje em dia, em relação a sua população, menos alimentos do que
antes da última guerra mundial, e suas exportações per capita diminuíram três
vezes, a preços constantes, desde a véspera da crise de 1929. O sistema é muito
racional do ponto de vista de seus donos estrangeiros e de nossa burguesia de
intermediários, que vendeu a alma ao Diabo por um preço que teria envergonhado
Fausto. Mas o sistema é tão irracional para com todos os demais que, quanto
mais se desenvolve, mais se tornam agudos seus desequilíbrios e tensões, suas
fortes contradições. Até a industrialização dependente e tardia, que
comodamente coexiste com o latifúndio e
as estruturas da desigualdade, contribui para semear o desemprego ao invés de
tentar resolvê-lo; estende-se a pobreza e concentra-se a riqueza, que conta com
imensas legiões de braços cruzados, que se multiplicam sem descanso. Novas
fábricas se instalam nos pólos privilegiados de desenvolvimento - São Paulo,
Buenos Aires, a cidade do México -, porém reduz-se cada vez mais o número da
mão-de-obra exigido. O sistema não previu esta pequena chateação: o que sobra é
gente. E gente se reproduz: Faz-se o amor com entusiasmo e sem precauções. Cada
vez mais, fica gente à beira do caminho, sem trabalho no campo, onde o
latifúndio reina com suas gigantescas terras ociosas, e sem trabalho na cidade,
onde reinam as máquinas: o sistema vomita homens. As missões norte-americanas
esterilizam maciçamente mulheres e semeiam pílulas, diafragmas, DIUs, preservativos
e almanaques marcados, mas colhem crianças; obstinadamente, as crianças
latino-americanas continuam nascendo, reivindicando seu direito natural de
obter um lugar ao sol, nestas terras esplêndidas, que poderiam dar a todos o
que a quase todos negam.
Em princípios de novembro de 1968, Richard
Nixon comprovou em voz alta que a Aliança para o Progresso havia cumprido sete
anos de vida e, entretanto, agravaram-se a desnutrição e a escassez de
alimentos na América Latina. Poucos meses antes, em abril, George W. Ball
escrevia em Life: "Pelo menos durante as próximas décadas, o
descontentamento das nações pobres não significará uma ameaça de destruição do
mundo. Por mais vergonhoso que seja, o mundo tem vivido, durante gerações, dois
terços pobres e um terço rico. Por mais injusto que seja, é limitado o poder
dos países pobres". Ball encabeçara a delegação dos Estados Unidos na
Primeira Conferência de Comércio e Desenvolvimento em Genebra, e votara contra
nove dos doze princípios gerais aprova dos pela conferência, com o objetivo de aliviar as
desvantagens dos países subdesenvolvidos no comércio internacional.
São
secretas:" as matanças da miséria na América Latina; em cada ano explodem,
silenciosamente, sem qualquer estrépito, três bombas de Hiroxima sobre estes
povos, que têm o costume de sofrer com os dentes cerrados. Esta violência
sistemática e real continua aumentando: seus crimes não se difundem na imprensa
marrom, mas sim nas estatísticas da FAO. Ball diz que a impunidade é ainda
possível, porque os pobres não podem desencadear uma guerra mundial, porém o
Império se preocupa: incapaz de multiplicar os pães, faz o possível para
suprimir os comensais. "Combata a pobreza, mate um mendigo!",
rabiscou um mestre do humor-negro num muro da cidade de La Paz. O que propõem
os herdeiros de Malthus senão matar a todos os próximos mendigos, antes que
nasçam? Robert McNamara, o presidente do Banco Mundial, que tinha sido presidente da Ford e secretário da Defesa,
afirma que a explosão demográfica constitui o maior obstáculo para o progresso
da América Latina e anuncia que o Banco Mundial dá prioridade, em seus
empréstimos, aos países que realizam planos para o controle da natalidade.
McNamara comprova, com pesar, que os cérebros dos pobres pensam cerca de 25% a
menos, e os tecnocratas do Banco Mundial (que já nasceram) fazem zumbir os
computadores e geram complicadíssimas teses sobre as vantagens de não nascer.
"Se um país em desenvolvimento, que tem uma renda média per capita de 15O
a 2OO dólares anuais, consegue reduzir sua fertilidade em 5O% num período de 25
anos, ao cabo de 3O anos sua renda per capita será superior pelo menos e 4O% ao
nível que teria alcançado mantendo sua fertilidade, e duas vezes mais elevada
ao fim de 6O anos", assegura um dos documentos do organismo. Tornou-se
célebre a frase de Lyndon Johnson: "Cinco dólares investidos contra o
crescimento da população são mais eficazes do que cem dólares investidos no
desenvolvimento econômico." Dwight Eisenhower prognosticou que, se os habitantes
da Terra continuassem multiplicando-se no mesmo ritmo, não só se intensificaria
o perigo de uma revolução, mas também se produziria "uma degradação do
nível de vida de todos os povos, o nosso inclusive".
Os Estados
Unidos não sofrem, dentro de suas fronteiras, o problema da explosão
demográfica, mas se preocupam, como ninguém, em difundir e impor, nos quatros
pontos cardiais, a planificação familiar. Não somente o governo; também
Rockefeller e a Fundação Ford sofrem pesadelos com milhões de crianças que avançam,
como lagostas, partindo dos horizontes do Terceiro Mundo. Platão e Aristóteles
haviam-se ocupado do tema antes de Malthus e McNamara; contudo, em nossos
tempos, toda esta ofensiva universal cumpre uma função bem definida: propõe-se
justificar a desigual distribuição de renda entre os países e entre
as classes sociais, convencer aos pobres que a pobreza é o resultado dos filhos
que não se evitam e pôr um dique ao avanço da fúria das massas em movimento e
em rebelião. Os dispositivos intra-uterinos competem com as bombas e as
metralhadoras, no Sudeste asiático, no esforço para deter o crescimento da
população do Vietnã. Na América Latina é mais higiênico e eficaz matar os
guerrilheiros nos úteros do que nas serras ou nas ruas. Diversas missões norte-americanas
esterelizaram milhares de mulheres na Amazônia, apesar de ser esta a zona habitável mais deserta do planeta. Na maior
parte dos países latino americanos não sobra gente: ao contrário, falta. O
Brasil tem 38 vezes menos habitantes por quilômetro quadrado do que a Bélgica;
Paraguai, 49 vezes menos do que a Inglaterra; Peru, 32 vezes menos do que o
Japão. Haiti e El Salvador, formigueiros humanos da América Latina, têm uma
densidade populacional menor do que a Itália. Os pretextos invocados ofendem a
inteligência; as intenções; reais inflamam a indignação. Afinal, não menos da
metade dos territórios da Bolívia, Brasil, Chile, Equador, Paraguai e Venezuela
está habitada por ninguém. Nenhuma população latino-americana cresce menos do
que a do Uruguai, país de velhos; entretanto nenhuma outra nação tem sido tão
castigada, por uma crise que parece arrastá-la aos últimos círculos dos
infernos. O Uruguai está vazio e seus campos férteis poderiam dar de comer a
uma população infinitamente maior do que a que hoje sofre, sobre seu solo,
tantas penúrias.
Há mais de
um século, um chanceler da Guatemala tinha sentenciado profeticamente:
"Seria curioso que do seio dos Estados Unidos, de onde nos vem o mal,
nascesse também o remédio." Morta e enterrada a Aliança para o Progresso,
o Império propõe agora, com mais pânico do que generosidade, resolver os
problemas da América Latina, eliminando de antemão os latinoamericanos. Em
Washington, já há motivos para suspeitar que os povos pobres não preferem ser pobres.
Mas não se pode querer o :" fim sem querer os meios: aqueles que negam a
libertação da América Latina, negam também nosso único renascimento possível, e
de passagem absolvem as estruturas vigentes. Os jovens multiplicam-se,
levantam-se, escutam: o que Ihes oferece a voz do sistema? O sistema fala uma
linguagem surrealista: propõe evitar os nascimentos nestas terras vazias; diz
que faltam capitais em países onde estes sobram, mas são desperdiçados; chama
de ajuda a ortopedia deformante dos empréstimos e à drenagem de riquezas que os
investimentos estrangeiros provocam; convoca os latifundiários a realizarem a
reforma agrária, e a oligarquia para pôr em prática a justiça social. A luta de
classes não existe - decreta-se -, mais que por culpa dos agentes forâneos que
a fomentam; em troca existem as classes sociais, e se chama a opressão de umas
por outras de estilo ocidental de vida. As expedições criminosas dos marines
têm por objetivo restabelecer a ordem e a paz social, e as ditaduras fiéis a
Washington fundam nos cárceres o estado de direito, proibem as greves e
aniquilam os sindicatos para proteger a liberdade de trabaIho.
Tudo nos é
proibido, a não ser cruzarmos os braços? A pobreza não está escrita nos astros;
o subdesenvolvimento não é fruto de um obscuro desígnio de Deus. As classes
dominantes põem as barbas de molho, e ao mesmo tempo anunciam o inferno para
todos. De certo modo, a direita tem razão quando se identifica com a
tranqüilidade e a ordem; é a ordem, de fato, da cotidiana humilhação das
maiorias, mas ordem em última análise; a tranqüilidade de que a injustiça
continue sendo injusta e a fome faminta. Se o futuro se transforma numa caixa
de surpresas, o conservador grita, com toda razão: "Traíram-me." E os
ideólogos da impotência, os escravos, que olham a si mesmos com os olhos do
dono, não demoram a escutar seus clamores. A águia de bronze do Maine,
derrubada no dia da vitória da revolução cubana, jaz agora abandonada, com as
asas quebradas sob o portal do bairro velho de La Habana. A partir de Cuba,
outros países iniciaram, por vias distintas e com meios distintos, a
experiência da mudança: a perpetuação da ordem atual das coisas é a perpetuação
do crime. Recuperar os bens que sempre foram usurpados, equivale a recuperar o
destino.
Os
fantasmas de todas as revoluções estranguladas ou traídas, ao longo da
torturada história latino-americana, emergem nas novas experiências, assim como
os tempos presentes, pressentidos e engendrados pelas contradições do passado.
A história é um profeta com o olhar voltado para trás: pelo que foi e contra o
que foi, anuncia o que será. Por isso, neste livro, que quer oferecer uma
história da pilhagem e ao mesmo tempo contar como funcionam os mecanismos
atuais de espoliação, aparecem os conquistadores nas caravelas e, próximo, os
tecnocratas nos jatos; Hernán Cortés e os fuzileiros navais; os corregedores do
reino e as missões do Fundo Monetário Internacional; os dividendos dos
traficantes de escravos e os lucros da General Motors. Também os heróis derrotados
e as revoluções de nossos dias, as infâmias e as esperanças mortas e
ressuscitadas: os sacrifícios fecundos. Quando Alexander von Humboldt
investigou os costumes dos antigos habitantes indígenas do planalto de Bogotá,
soube que os índios chamavam de guihica as vitimas das cerimônias rituais.
Quihica significava porta: a morte de cada eleito abria um novo ciclo de cento
e oitenta e cinco luas.
Introdução do Livro "As veias abertas da América Latina" - Eduardo Galeano
Bibliografia sugerida:
Martim Cererê - Cassiano Ricardo - Editora José Olympio
Lavoura arcaica - Raduan Nassar - Cia das Letras
As veias abertas da América Latina - Eduardo Galeano - Editora Paz e Terra
Marighella - o guerrilheiro que incendiou o mundo - Cia das Letras
Livro dos Abraços - Eduardo Galeano - LPM POCKET
Enterrem meu coração na curva do rio - Dee Brown - LPM POCKET
O poder do Mito - Joseph Campbell - Editora Palas Athena
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